Cartas Lisboetas te saúda

Bom dia, boa tarde e boa noite.
Sejam bem-vindos ao meu blog, ele foi criado partindo da ideia de uma amiga sobre a minha escrita.
Tentarei postar alguns momentos descritos por mim como uma carioca que resolveu há 9 anos viver em Lisboa.
Espero não decepciona-los, um abraço e sejam bem-vindos a minha pequena morada.
Lilia Trajano

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Lisboa

Lisboa, a cidade…

Quando conheci Lisboa pela primeira vez, o que me chamou logo a atenção, ou me despertou o olhar foi saber que na capital de uma cidade europeia havia favelas. Aqui eles não chamam favela, mas bairro degradado, o que ao começar a escrever minha tese de mestrado fui logo corrigida por minha orientadora, que dizia não ser bairro degradado, mas sim, bairro com habitação degradada, no principio não percebi bem a diferença, e ela então muito amavelmente me disse: "se você chama um bairro de degradado, está a sugerir que as pessoas lá também o são, não é o caso, eles apenas vivem em condições degradas, pela pobreza, pela imigração, pelo desemprego, enfim, pelo estigmatismo que o próprio bairro em si tem, não vamos por mais este conceito, não é"

Dali por diante sempre me dirigi ao bairro como, bairro de habitação degrada.

Mas, como eu dizia, quando cheguei a Lisboa vim iludida, acreditava que tudo seria fácil, afinal já havia trabalhado por cá, já conhecia os paramentos das cidades europeias, e no entanto, me enganei.

Sofri muito, senti-me só, destas solidões que não há maneira de retractar. Vivia num apartamento sozinha na Costa da Caparica, mas a pessoa que era proprietária do apartamento não me deixava receber visitas, controlava até os meus telefonemas, me senti um pouco prisioneira. No mestrado estava a ter muitos problemas de ordem técnica, porque aqui em Portugal, quando uma pessoa dirigi uma instituição e tem um nome a zelar, quando adoece, que foi o caso da minha directora do mestrado, ela não é substituída, porque no entender deles, estariam desvalorizando o seu trabalho, e que em breve ela poderia melhorar e retornar as aulas e a direcção do Instituto Superior de Serviço Social. (Tal facto não aconteceu, pois ela meses depois veio a falecer). Claro sou brasileira, não concordava com aquilo e reclamei, porque, por este motivo acima citado, ficamos sem aulas, e com a diferença que continuávamos a pagar as propinas independentes de termos ou não aulas, reclamei e muito. Até que se fez uma reunião em que foi estabelecido que ficavam congelados as nossas propinas até retornamos as aulas.

Bem juntando ao mestrado frustrado, a traição na Costa da Caparica, o frio e a solidão, a falta de grana, minhas economias já estavam no fim. Recebi a proposta de um amigo para viver na casa deles (eram um casal de família portuguesa com duas crianças) e que viviam numa quinta (uma espécie de sitio, fazenda) com horta, plantação e pé de frutas. Aceitei e fiquei lá por um bom tempo, o menino Gabriel o filho mais novo do casal, (hoje meu afilhado), então na altura era recém nascido, funcionou para mim como uma espécie de despertar para a vida, através dele renasci e criei forças, resiliência para lutar pela vida.



Percebi que meus problemas eram pequenos diante das diversidades da vida e do mundo. Aprendi mais ainda sobre o verdadeiro sentido da palavra amizade, solidariedade e também aprendi a lidar com a terra.

Agradeci a Deus, ou para quem quer, o supremo Universo por tudo, chorei muito, emagreci demasiado, até perceber que estava emagrecendo por ter adquirido uma doença no estômago, fiz os tratamentos necessários, dieta rigorosa que até hoje tento manter, um cirurgia espiritual e continuei seguindo com fé em Deus.

Amei mais ainda e por tudo a pessoa, e não só a cantora: Maria Bethânia, porque tem sempre uma canção que nos desperta para a vida, “levanta sacode a poeira e dá a volta por cima” cantava ela sem parar, foi o que fiz e depois quando tive a oportunidade de lhe abraçar, agradeci por isso. Agradeci pela beleza e musicalidade tão brasileira do CD Brasileirinho, creio não haver nada melhor para alguém que esta longe da sua pátria do que este disco, e o show todo, como sou manteiga derretida, chorei o show inteiro. Até hoje choro quando estou perto dela.

Ela neste trabalho remete-nos a vários momentos do tempo, desde a escravidão, ao cuidado do povo indígena com a natureza, ao amor, ao encontro com a fé, a preservação pela água, um trabalho lindíssimo.

Ainda sem trabalho e só no mestrado, o qual mudei o projecto várias vezes até definir escrever sobre os jovens da Cova da Moura, o bairro de habitação degrada. Tive ajuda em muitos momentos e de várias espécie da minha irmã Moacira e meu cunhado Eduardo, além de receber cartas, telefonemas de amigas como Maria Helena, Fátima Antunes, Rosália, e de meus irmãos e irmãs e de minha mãe que ficaram no Brasil.Tudo isso me fez mais forte, e foi por isso que venci. Já lá vão nove anos desde então.

Conheci uma assistente social maravilhosa: Fátima Corte-Real, coordenadora do serviço social do Hospital, que me apoiou em várias coisas, mas a primeira medida dela foi ocupar meu tempo livre, me tirando assim de uma forte depressão, ela me fez ser voluntária no Hospital Santo António dos Capuchos em Lisboa, todos os dias da semana, foi o melhor remédio que tive, aprendi que quando a gente se dá, o mundo nos devolve, a partir daí recebi várias propostas de trabalho. Melhorei minha vida económica, actuei na minha área como assistente social e aprendi a conhecer melhor os sistemas das instituições, compreendi que muitas delas vivem da miséria para ganhar dinheiro, e poucas são as que realmente desenvolvem um trabalho sério preocupada com o bem estar do outro e não da remuneração. Hoje sei bem separar o joio do trigo, por vezes é difícil, mas com clareza dos teus ideias consegues.

Uma capital europeia não difere de uma cidade ou capital de qualquer outra parte do mundo, pois o que muda são as tuas atitudes, pois os teus valores vão contigo para onde tu fores, Lisboa me recebeu de braços abertos, foi aqui que consegui renascer das cinzas, feito uma Fénix, e percebi que o centauro que mora em mim, também é humano.

Esqueci de dizer, que eu consegui depois de todos os problemas com o Instituto Superior de Serviço Social, que foi vendido para a Fundação Minerva, na Universidade Lusíada de Lisboa, concluir o meu mestrado.

Boa terça feira a todos, a vida é feita para viver e desfrutar com carinho e atenção de “horinhas de descuido” bem o diz Bethânia.

Lilia Trajano

5 comentários:

Anônimo disse...

Já dizia a nossa avó "Que tudo que vem fácil... vai fácil". Por isso que temos histórias para contar... em nossas vidas e sempre há lutas.... lutas e lutas.
Querida tu és uma guerreira!!!!
Bjos.

MEL - Maria Em Lisboa disse...

Obrigada, minha anónima, como dizia o poeta: " A vida só se dá pra quem se deu, pra quem amou, pra quem viveu, pra quem sofreu." Beijos

Marta Pereira disse...

Pedoa amiga... eu na minha ansiedade não assinei... Mas sua anônima sou eu

CILA SANTOS disse...

Eh maninhaqdo nos ocupamos com os necessitados as nossa dores sao pequenos graos de areis.Te admiro muito e te considero uma guerreira.bjs
cila

MEL - Maria Em Lisboa disse...

Obrigada Cila, muito que tenho hoje é também um pouco por sua ajuda e carinho, um beijo